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32 PRÁTICA CLÍNICA
Gengivoestomatite crónica felina
e a terapia celular
A GECF tem uma percentagem importante de pacientes que se mostram refratários aos tratamentos
tradicionais. A terapia celular imunomoduladora com MSC demonstrou ser inovadora, segura e
simples para estes pacientes.
Antonio J. Villatoro Jiménez , Fernando Fariñas A sua etiopatogenia é complexa e está ainda pouco des‑
1,2
Guerrero e José Becerra Ratia 2,3 crita. Existe consenso acerca de um importante componen‑
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1 ImmuneStem. Instituto de Inmunología Clínica y Terapia te imunopatológico, responsável por uma resposta imuni‑
Celular. Málaga. www.immunestem.com tária inapropriada na mucosa oral, secundária a uma
2 Labret. Laboratorio de Bioingeniería y Regeneración estimulação antigénica crónica frente a diferentes fatores.
Tisular. Departamento de Biología Celular. Facultad de Entre eles incluem ‑se fatores ambientais que, somados à
Ciencias. Universidad de Málaga. Málaga. intervenção de algumas bactérias e vírus, parecem ser de‑
3 Bionand. Centro Andaluz de Nanomedicina y terminantes. Consideram ‑se implicadas várias patologias,
Biotecnología. Parque Tecnológico de Andalucía. Málaga
Imagens cedidas pelos autores entre as que destacam diversos agentes patogénicos sisté‑
micos (calicivírus felino, herpesvírus, vírus da leucemia,
vírus de imunodeficiência e Bartonella), bem como doen‑
A gengivoestomatite crónica felina (GECF) é uma doen‑ ças dentárias (reabsorção dental felina e doença periodon‑
ça dolorosa e debilitante, frequente em medicina felina, tal), e/ou reações de hipersensibilidade (resposta a bactérias
cujo maneio é complexo e implica um elevado índice de de placa bacteriana e alergias alimentares) (2 ‑4).
frustração, tanto para o clínico, como para o proprietário. Foi demonstrado um predomínio de linfócitos T CD8
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Manifesta ‑se como um processo oral inflamatório grave sobre T CD4 , o que sugere uma resposta imunomediada
+
que se prolonga durante meses ou anos, de origem mul‑ celular citotóxica altamente destrutiva da lâmina própria e
tifatorial, caracterizado por uma resposta crónica focal ou do tecido submucoso oral. Histologicamente, traduz ‑se em
difusa que afeta as gengivas, mucosa oral e frequente‑ lesões consistentes em hiperplasia epitelial, com ulceração
mente a faringe, língua e outras estruturas moles da boca. e presença de infiltrado inflamatório formado principalmen‑
Pode alcançar níveis de prevalência de até 12% da popu‑ te por linfócitos e células plasmáticas.
lação (1,2). Foi descrita infiltração de células T CD3 no epitélio e na
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submucosa oral, assim como de linfócitos B CD20 , princi‑
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palmente no estroma sub ‑epitelial (4 ‑6) (figura 1).
Os indivíduos afetados apresentam dor oral grave, sialor‑
Resposta Th1 citotóxica reia, halitose, hiporexia, perda de peso, diminuição do ato
de lambedura, irritabilidade e diminuição da sua atividade.
Para além da sua manifestação clínica a nível oral, os gatos
com GECF apresentam evidências sistémicas de inflamação
Proliferação linfoplasmocitária como neutrofilia, hipergammaglobulinemia policlonal, al‑
IL-1β + teração de biomarcadores da inflamação e aumento da
INF-γ CD8 + expressão de citoquinas pró ‑inflamatórias (IL ‑1ß, TNF, INF ‑γ)
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TNF-α Ø CD4 /CD8 no soro (5,7,8).
CD3 T CD20 B Um bom sistema para a avaliação e controlo da evolução
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do tratamento é a utilização do sistema de pontuação de
IgM
Neutrofilia atividade SDAI (Stomatite Disease Activity Index) (3,7) (fi‑
PFA IgG gura 2), tal como o controlo de alguns biomarcadores da
IgA
inflamação.
Dada a sua complexidade e, por vezes, difícil maneio,
foram estabelecidas diferentes estratégias terapêuticas cujos
Figura 1. Imunoterapia da GECF. Trata-se de uma resposta polarizada frente a diferentes objetivos principais são o de eliminar a dor e as fontes de
agentes que desencadeia um quadro sistémico de inflamação, com aumento de deter- infeção ou inflamação crónica na boca. Estas terapias per‑
minadas citoquinas pró-inflamatórias, desequilíbrio do rácio CD4+/CD8+ por aumento mitem uma melhoria parcial ou temporal, mas não a sua
destes últimos, neutrofilia, alteração de biomarcadores da inflamação e hipergammaglo- cura total. Em geral, englobam a eliminação de peças den‑
bulinemia policlonal. Localmente traduz-se em lesões na mucosa oral: hiperplasia epite- tárias até à administração de analgésicos, antibióticos, cor‑
lial, ulceração e presença de infiltrado inflamatório formado principalmente por linfócitos e ticosteroides e imunomoduladores de forma contínua e
células plasmáticas. prolongada, com efeitos adversos descritos (2,5,9).
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ANIMAL